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Análise: Herman Hertzberguer


Ateliê Integrado de Arquitetura: análise
Gabriela de Barros Grossi

O Instituto Casa da Glória, cujo início da construção deu-se por volta do ano 1775, abrigou ao longo do tempo inúmeros usos e atividades conforme o público que o frequentava. Hoje, ao hospedar estudantes para trabalhos de campo e receber turistas visitantes em suas dependências, a casa caracteriza-se como um espaço intermediário entre as ideias comuns de público e privado, visto que apresenta espaços em sua composição que abrigam a dupla interpretação. Esse é o caso da sala escolhida como local de trabalho pelo grupo.
Localizada no segundo andar do Instituto, logo após a passagem pelo passadiço, a sala do mezanino apresenta uma urdidura histórica que delimita condições para que os variados usuários desfrutem de uma enorme liberdade em sua ocupação. O alto pé direito, a longa extensão de aproximadamente 27 metros, a presença de um mezanino ao fundo com baixa altura, inúmeras janelas que tornam o local arejado e agradável permitiram que a trama da sala se desenvolvesse com enorme variedade. Quando ocupada pelas antigas freiras residentes do local, a sala recebeu a função de capela e o mezanino representava o local do coro. Nas ocupações mais recentes, ela tornou-se uma sala de estudos, utilizada principalmente pelos estudantes hóspedes do IGC, e preservou aspectos históricos que evidenciavam o caráter de museu da Casa; contudo, ao não se explorar as irregularidades do mezanino, a mudança de função desenvolveu uma certa residualidade no local. Sob esses incentivos, foi estruturado uma proposta de intervenção cuja nova organização espacial promovesse uma forma convidativa, evocando apropriações diferentes por pessoas diferentes, que poderia assumir espaços articulados entre si na nova trama a ser formada. Entretanto, ressalta-se que algumas práticas na resolução final apresentada precisam ser contestadas.
Sob essas circunstancias, ao analisar o espaço gerado é necessário evidenciar alguns pontos determinantes em seu zoneamento territorial.  Em primeiro lugar, a sala pode ser comparada ao que Herman Hertzberger se referencia às galerias (Passage du Caire, Paris 1779), espaços públicos que servem como extensão da rua, relativizando o “fora” do “dentro”, uma vez que recebe visitantes em suas dependências. Em contrapartida, a estipulação de horários de visita, trancas nas portas em eventos esporádicos, espaços privados que guardam materiais de acesso único do IGC e até mesmo a presença de grupos de estudantes no local servem de inibidores para um pleno acesso público no território[1]. A própria existência de vidros nas portas de entrada pode ser considerada um importante grau de acesso.  Em segundo, é imprescindível destacar que a variação constante de usuários demanda a criação de um espaço polivalente que carregue flexibilidades mínimas na disposição espacial e permitam configurações funcionais variadas sem entrar no aspecto da neutralidade, uma vez que a presença de formas definidas é essencial para a formação bem-sucedida de um espaço.
Nesse sentido, ao propor uma integração entre áreas expositivas do museu, suprindo a demanda percebida em revivenciar a história local, e áreas de estudo intrínsecas – como a presença de maquetes virtuais interativas que permitem tanto a visualização da cidade por parte do turista, quanto como plataforma de estudo aos hospedes de campo –, o projeto consegue prover estímulos necessários para essas ocupações variadas. Além disso, a possibilidade de separação do mobiliário central e de rotação da maquete anteriormente citada fornecem outras probabilidades configurativas que podem acarretar diversas interpretações. Todavia, o mesmo não pode ser observado com tanta veemência na escolha do mobiliário destinado às mesas de estudo de campo; apesar de poderem ser deslocadas e possibilitarem a formação de grupos dispostos com mais ou menos integrantes conforme sejam distribuídas no espaço, a escolha pela mesa de madeira – que embora apresente um design comparativamente mais leve ao mobiliário atual – ainda impossibilita muitas ações livres pois, devidas as necessidades diárias de uso, precisam ser mais robustas.  O excesso de funcionalidade, nesse caso, gerou uma extrema especificação de requisitos e tipos de utilidade sem a devida integração com o ambiente, podendo gerar uma rápida obsolescência.  Sob outro aspecto, a exploração de irregularidades, como o pé direito baixo e as colunas de sustentação do mezanino, ao propor soluções lúdicas que levam ao extremo essas características (almofadas no chão e aumento do número de pilares para receber exposições) e que ao mesmo tempo suprem as necessidades observadas no espaço promovem formas estimulantes que convidam o público frequentador a apropriar-se da sala.
Por fim, conclui-se, ainda, que a intervenção proposta não abrange os preceitos determinados no conceito de obra pública uma vez que não dá possibilidades aos seus frequentadores de sentirem-se pessoalmente responsáveis com a manutenção do local.



[1] “ O uso do espaço público por residentes, como se fosse ‘privado’, fortalece a demarcação por parte do usuário deste área aos olhos dos outros” HERTZBERGER, Herman; Lições de arquitetura pag.17

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